Thursday, March 24, 2005

Viagens Trujillo

Terça feira passou a correr. Talvez pela ansiedade de sair em viagem ou pura e simplesmente por ter sido mais um dia rotineiro. Como sempre tudos se fez nos ultimos instantes. Banho tomado, mochila às costas com somente o essencial, máquina pronta para muitas fotos e a motivação de um qualquer aventureiro. Como todos estes ingredientes me fiz ao caminho. A viagem foi muito boa, num Bus Cama, como eles aqui chamam aos expressos de longo curso. Nestes autocarros o espaço não falta e até têm uma espécie de tábua nas costas do banco da frente para baixar e estender os pés. Ora aqui está. Com o banco deitado e com a tábua solta ficamos com quase uma cama. Fantástico, não acham?!
Durante a viagem conheci uma senhora que foi o meu Anjo da Guarda. Julia Wong de nome, poetisa, escritora e professora de profissão, o que só viria a descobrir mais tarde. Conhecedora de um vasto mundo, com passagens pela Alemanha e por Macau. Isso mesmo, o nosso antigo e belo território. A pérola do oriente foi o nosso elo de ligação e ínicio de uma longa conversa.
Dormidas uma horas, à chegada a Trujillo esta senhora prestou-se a ajudar em tudo o que podia, já que nas suas viagens pela Europa e Ásia sempre fora ajudada e bem recebida. Aqui tomei o pequeno almoço em casa de um amigo da familia e com ele fui conhecer todo o itenerário de Trujillo.
Huaca del Sol e de la Luna. Dois centros hitóricos, o primeiro politico e o segundo religioso da civilização Moche. Destas duas só a do satélite terrestre está aberta ao publico. Uma piramide de 5 andares, construidos uns por cima dos outros. Isto é, cada século que passava contruiam mais uma plataforma nova, envolvendo por completo a anterior. Algo de fantástico, com pinturas da época tão naturais como se fossem de hoje. Algo com mais de 1500 anos de idade. Impressionante!
À volta visitei o centro da cidade com as suas casas e igrejas coloniais. Os seus balcôes tipicamente andaluzes e as suas cores vivas faziam recordar uma Espanha quente e de longas planícies.
A tarde estava reservada para a visita a uma das cidade mais emblemáticas das antigas civilizações. Chan Chan, com cerca de 35000 habitantes tinha todo um sistema de organização e defesa impressionante. Conhecedores de astrologia e engenharia construiram esta imensa cidade com canais de abastecimento de água e resistência sismica. Muralhas imponentes guardam ainda os 5% do que resta de uma imensa cidade. Os seus labitrintos não permitem a qualquer um aventurar-se e isso obriga a contratação de um guia conhecedor e já agora, bom contador de histórias. Há uma praça cerimonial maior que 2 campos de futebol, que está construida de forma a que basta uma pessoa falar um pouco mais alto para que o som se propague por todo complexo religioso. Algo que mostra o avanço destas culturas sul americanas. Isto tudo antes dos Incas, muito antes...
Saíndo de Chan-Chan, há mais uma série de monumentos a visitar, mas a escassez do tempo só me permitiu ir até às praias de Hunchaco. Hunachaco é um balneáiro muito conhecido pelos cavalos de Tora. Pequenas embarcações feitas de canas com um bico para enfrentarem as ondas, tipo os sapatos de um àrabe. Estas frageis, à vista, mas rubustas embarcações, aventuram-se no mar até para lá do horizonte. Mais uma prova deixada pelos Incas, enquanto grandes navegantes e pescadores. Há pessoas que afirmam que o surf apareceu por este tipo de embarcões, quando há centenas de anos atrás uma séria de embarcações e marinheiros levados pela corrente, desembarcaram nas ilhas do Hawai. Verdade ou não, o certo é que este tipo de embarcão de origem Inca, só se vê aqui e nas ilhas americanas dos Pacífio.
De noite fiz uma viagem até Chepen, pequena cidade entre Trujillo e Chiclayo. Aqui pernoitei, na casa de família da escritora e onde também adquiri um livro seu e claro autografado!

Tuesday, March 22, 2005

Semana 10 – Mini Férias da Semana Santa

Um sono leve não deu para que o corpo descansasse o suficiente. Um acordar com dificuldades trouxe-me uma manhã difícil e lenta. É segunda-feira, nada a fazer... Entretido pela leitura dos jornais (tenho de me manter actualizado sobre o fim de semama lusitano) e o trabalho, lá chegou a hora de almoço. Antes viera o “moço de recados” da Oltursa, a empresa que me vai levar até às minhas mini – férias pelo norte do Peru. Ora aqui está uma parte em que os peruanos levam vantagem. Um serviço destes dava jeito em Portugal. Da comodidade do sofá, basta um telefonema para marcar a viagem e eles vem a casa entregar e receber o pagamento.
Um almoço diferente, aquele que escolhi para o dia de hoje. Jamonada con ensalada. Tal como o arroz de pato dos sociais, também aqui foi necessária uma árdua busca para encontrar o Jamón escondido…
O dia terminou de trabalho acabou com umas dores de cabeça terríveis. Já não bastava o stress do trabalho e o raio do Peseiro ainda me pregou alguns sustos. O homem está mesmo com o cérebro paralisado com tantas partidas em tão pouco espaço de tempo. Onde é que se já viu, a jogar contra 9, se acaba o jogo quase com o coração nas mãos… Ai meu Deus, só a mim…
Antes de regressar a casa ainda passei por uma típica livraria peruana. Em busca de um guia da Lonly Planet encontrei, graças ao velho livreiro, como ele se intitulou, um ainda melhor. Por sua sugestão adquiri o guia Mitsubushi, um parente próximo do guia Michelin, com restaurantes, hotéis, ruas, monumentos, rotas e destinos, enfim um sem número de sugestões com grande qualidade. A acompanhar, pois um livro nunca deve vir só, “La ciudad y los perros” do maior escritor peruano da actualidade, Mário Vargas Llosa.
No Café Zeta, acompanhado com o capuccino, dei conta que a compra tinha sido muito bem feita, pois a quantidade e a qualidade das informações são infindáveis. Algo para descobrir quando amanhã, por esta hora, já estiver em viagem para Trujillo. Chyclayo, Cajamarca, Piura e a belíssima praia de Mancora são os outros destinos nestes 6 dias de “vacaciones de Semana Santa”.

Monday, March 21, 2005

Semana 9 – Macunaìma e a cena crioula...


A semana antevia-se trabalhosa. Entrava-se no último mês de trabalho e os dias que aí vêm não se prevêem nada fáceis. Como sempre, os afazeres amontoam-se e pelo meio ainda há 5 dias de férias por época da Páscoa e mais uma viajem de 4 dias até Cusco, esta última em trabalho e quiçá lazer. Ou seja, 5 dias de improdutividade…
Por supuesto, com o mesmo pensamento pessimista, o Todo o Poderoso resolveu brindar os limenhos com um espesso manto de neblina. O efeito de estufa abatia-se sobre toda a cidade e para os menos habituados, como yo, a respiração efectuava-se com mais intensidade. Lima, deve ser a única cidade que se pode lutar com Londres pela quantidade de “smog”. Tal com a capital Inglesa, também esta enorme cidade é privada do sol durante 7 meses ao ano. Algo que se explica pela quantidade de poluição na atmosfera e pela diferença de pressões na atmosfera entre ela e os montes circundantes.
Lá pela uma veio a primeira espreitadela e há minha saídas, mais ou menos pelas 4:30 já estava resplendoroso no seu sítio do costume. A caminho do far west
Este dia ficou também marcado pela minha segunda visita a um supermercado de produtos pirateados, desviados, falsificados, roubados, contrabandeados, o que possam imaginar… Desta vez fui comprar umas sapatinhas à zona dos contrabandos, ou seja. Não paguei imposto. Bem aquilo tinha tudo o que queriam… Sapatilhas Nike, Adidas, Puma, Reebok, O’Neal, Vans, DVS, DC, Etnies, etc., etc., etc. Tudo original e a um preço que apetecia trazer uns 10 pares. Havia quase todos os modelos… Um imensidão de sapatos, botas, t-shirts, calças, camisas, dvd´s, óculos, relógios, perfumes, etc. estendia-se até onde a vista alcançava. O calçado era todo original, a roupa não me davam a certeza, óculos, relógios, perfumes via-se a sua veracidade pelo preço e os DVD’s e Jogos tudo pirateado. Por fim, o material informático, consolas, som, vídeo e fotografia eram aos pontapés, talvez desviados, talvez roubados, talvez… mas sempre mais barato que no resto da cidade. A tecnologia é cara pois há pouca, e já sabemos, quanto mais rara, mais cara… Já tive para vender o portátil por 2000USD, só depois fiz as contas e em euros era quase o mesmo que tinha pago por ele… Ainda por cima ficava sem computador para cronicar… Nop, talvez no final. Depois de dar umas voltas, andarmos por lá perdidos e de rebuscar tudo à procura de bons preços, saímos porta fora e com as sapatilhas bem agarradas, não fosse um abutre “ratero” passar e leva-las como é habitual por estas paragens, apanhou-se um táxi e saiu-se do centro de Lima. Estes sítios são sempre mais baratos, e quase sempre se encontram no centro de Lima, o problema é que à saída podemos ficar sem o produto, pois a probabilidade de roubo é muito grande.

Martes e o sol são um par ideal. Penso que houve poucas terças em que o astro não aparecesse antes de eu abrir o olhito… Um dia que se previa particularmente cansativo e intenso. Trabalhar para recuperar o tempo perdido no dia anterior e aproveitar o facto de ficar por aquelas bandas para se poder avançar alguma coisa. Eram já oito da noite quando me pus a andar do emprego, com uma dor de cabeça terrível. Para trás ficava um almoço muito refastelante e um jogo Inter vs FCPorto que pecou pela pobreza e pelos erros cometidos pelos dragões. Agora só resta o meu Sporting na Europa. Mas por este andar, já não sei onde vai para. Ora tanto joga muito bem e goleia, ora não dá uma para a caixa e não faz nada. Recorda-me uns amigos e muitos companheiros de universidade. Cabeças muito boas, com enorme capacidade de raciocínio, mas que andam anos sem fazer nada e de repente, pressionados talvez pelos pais, fazem como 14 cadeiras num ano!!! Excelente! Mas depois andam mais um ou dois anos a mandriar… Assim é o meu Sporting, um triste retrato de um estudante que tanto é capaz do melhor, como de seguida do PIOR. Mas pronto…
A caminhada de meia hora até à Alianza Francesa fez-me bem. É um edifício com traços colónias. As cores, o formato em forma de U, as arcádias com os seus grandes a altos arcos, uma varanda a todo o correr, e no meio, completamente a destoar mas muito bem encaixado, um típico café parisiense. Não faltava a sua esplanada de mesinhas e cadeiras de madeira com almofadas de um tecido de riscas azul, verde ou vermelho com branco, um toldo verde a cobrir toda a área com um texto em letras douradas a dizer Café e umas floreiras a toda a sua volta delimitavam o perímetro de uma qualquer praça francesa invasora de uma arquitectura totalmente espanhola. Um anfiteatro composto por muitas caras bonitas esperava pelo início de um espectáculo sobre um índio da floresta amazónica. Macunaíma de título, Mário de Andrade, esse grande escritor brasileiro, o seu autor. A música brasileira soava no ouvido como um revitalizante, e só o facto de a narração do conto ter partes em português já era um motivo de satisfação. As luzes apagaram-se e de entre as paredes escuras apareceu uma senhora, que teve um desempenho fantástico, acompanhada por um músico não menos fenomenal. Quer na facilidade na narração do conto, quer na destreza da interpretação das personagens, conseguindo de um forma muito ágil prender a atenção das pessoas por quase uma hora e meia. A tudo isto soma-se a dificuldade em narra-lo, nalgumas partes, em Português (língua original, nos diálogos), em francês (quem paga J), e maioritariamente em espanhol.
No final, a oferta de um pisco souer, ajudou à conversa e ao términe de uma noite em beleza.

Quarta-feira, o dia mais produtivo da semana. Trabalho das 10 às 9 com muitas poucas interrupções. O hábito é tal que já tudo me passa ao lado. Tirando a Suiça que esteve de novo em casa para se despedir e passar a noite, não há nada de novo a assinalar. Esta vez estava mais bonita ainda. Uma corzinha escura acentuava-lhe os traços finos e uma beleza natural. Uma longa conversa entreteve-nos uma pequena parte da noite. A pobre da rapariga a meio teve uma quebra de tensão, o que vos pode levar a pensar que era da seca que estava a levar, mas não, fez questão de continuar uma vez que era ela quem estava a conduzir a conversa. Fiquei a saber que há o Boom Festival em Portugal. Fiquei impressionadíssimo e a pensar que até no Cú do Judas se aprende sobre o nosso país! Não é que tivesse aprendido muito, mas é uma novidade para mim! Ao que parece é um festival de música psicadélica, ou Boom como ela dizia e eu não entendia. … Nunca na minha curta vida tinha ouvido falar em tal estilo. Pelo meio Portugal, Suiça, Cusco, Ásia, Europa, musica, Equador, escola, universidade, Bolívia, Peru, amigos, neve, sol, frio, clima europeu, etc. e tal. No final, uma breve despedida, pois quando regressa-se já não a iria ver, e a promessa de um reencontro, quiça em Portugal agora na Queima das Fitas. Mais de resto, nada a assinalar, tirando os telefonemas do papá e da mana, e o regresso do meu pesadelo a casa. Espero que por pouco tempo…

O sol apareceu de uma maneira esplendorosa. Ainda não eram 7 da manhã e já um raio me atingia “mortalmente” o sono pesado. Abri o olhito, como se da primeira vez se tratasse e voltei a “cerralos” como num piscar de olhos. O levantar custou um bocadito, a conversa foi longa e as horas de sono escassas. Tal como nós, também o sol quis mostrar a sua melhor face na despedida de tão harmonioso figura. Os relógios, o queijo, os chocolates e a neve esperam o regresso de mais “uma filha pródiga”, que após 3 meses de deambulação pela América Latina volta a sua terra natal. Pelos vistos não por muito tempo. A rapariga tem planos tremendos…
O dia decorreu com algum cansaço e dores de cabeça a servirem de companheiros. Assim também chegou a noite, que em contraste com o dia mudou de humor tornando-se pesada e fria.
Ah, quase me esquecia. Afinal já não vou dia 28 de Abril… Vou a 2 de Maio…a minha mana vem cá e “obrigou-me” a adiar o voo. 40 Dollars. Chulos! Agora dou razão a quem diz para não se acreditar nas agências de viagem. Aí em Pt, disseram-me que não pagava nada, aqui chulam-me dinheiro. Apetece-me dizer “Roubaram a gaveta?? FDP…”

Sexta-feira, ultimo dia de uma semana cheia de trabalho e com algumas novas experiências. Para trás ficam a visita ao super-hiper-mega mercado de produtos sem IVA e com proveniência indefinida. Macunaíma lá regressou à sua selva e eu continuo na minha. Todos tentam sobreviver às adversidades da vida. Crianças vendendo caramelos, flores e agendas, cantando e tocando nos autocarros e ruas distraindo os passageiros e transeuntes, em vez de se entreterem com números e letras nos bancos da escola. Pequenos engraxadores com a “trouxa” às costas vagueiam pela rua, olhando e fazendo sinal para todos os pares de sapatos que passam, esperando que alguém entregue o seu calçado a um tratamento de beleza executado por uns dedos finos e manchados por tinta negra em vez da tinta de canetas ou marcadores. Uma triste realidade, para a qual, uma simples moeda em vez de ajudar apenas piora a situação.
O dia passou-se rápido em trabalho e em busca de uma passagem de autocarro para Trujillo. Coisa impossível em vésperas de Semana Santa. São 4 dias de “férias” para os peruanos e 5 dias para o pessoal da minha “oficina”.
No final do dia, uma Ceia Crioula, esperava pelos estrangeiros da Universidade Católica. Entre trainees de AIESEC e alunos de intercâmbio, estávamos numa espécie de república, cerca de 100 pessoas. Tendo como centro das atenções a comida peruana, europeus, americanos, australianos, asiáticos e africanos, reuniram-se em volta de uma mesa. Em um pequeno espaço, pouco mais de uma centena de almas demonstravam que é possível existir uma coabitação pacífica e salutar de pessoas e culturas dos 5 continentes. Aí conheci entre mais pessoas, uma brasileira. Até que enfim alguém que fale português. Esta era a opinião de ambos. Trocados e-mails e algumas ideias ficou combinado um encontro a ocorrer por um destes dias. Paulista de nascimento, italoportuguesa de descendência, ficou surpreendida, e eu também, por saber que estudei na Universidade de Coimbra. A mais famosa no Brasil e na qual quer fazer uma pós graduação em história ibérica. Afinal, os milhentos protocolos do Dr. Fernando Rebelo com universidades brasileiras deram resultado… :) Lá a espero!
A noite terminou numa discoteca, a Bierhouse, onde no meio de muitos copos, salsa, merengue, rock e pop conheci uma Dinamarquesa muito fixe mas muito bebida… Cansado, não resisti às 4 badaladas e já com os olhos a piscar regressei a casa onde de uma assentada adormeci que nem uma rocha.

A garganta seca pedia por água. A cabeça meia tonta reclamava um guronsan. O corpo mole e dormente um banho frio e “despertante”. Tomado um bom pequeno almoça, hora de ir a uma sessão da AIESEC. Uma actividade de boas vindas e de reinserção na sociedade de dois trainees peruanos vindos da Índia. Se pensava que o Peru era muito corrupto e degradado fiquei algo surpreendido quando o relato de ambos, faziam um retrato ainda pior do que eu pensava saber sobre este país península em pleno Oceano Índico. Desterrados numa das cidades varridas pelo Tsunami natalício, viveram alguns episódios curiosos, entre os quais ameaças e abandono por parte dos seus anfitriões. Ao que parece o Indiano e alguém sem palavra, vingativo, um pouco racista e que tem sempre razão! Bem, algumas destas características já conhecia, mas explicadas com exemplos e queixas reais, devo dizer que me surpreendeu um pouco tal personalidade. Não todos, mais as pessoas das castas da classe média e alta que têm acesso a boa educação e serviços, e que, devido a questões culturais, são superiores aos demais indianos e se acham superiores também os estrangeiros que para lá vão estagiar. Ainda bem que não fui para lá, senão ia-mos ter problemas… Paradoxalmente a estes “pavões asiáticos”, os restantes serviços eram fenomenais. Em jeito de graça virou-se para os trainees dizendo:“-Agora já sei como se sentem vocês aqui no Peru. Ao contrário do meu país, podia entrar nos melhores restaurantes, bares e hotéis que era recebido quase de passadeira vermelha!”. Com a prova de comida indiana, que me deu um começo de diarreia, diga-se de passagem, terminou a sessão que se revelou mais interessante do que eu imaginara. De regresso a casa, mais um dilema. O cansaço abatia-se sobre o meu corpo mas a vontade de sair era imensa. Vencido pelo físico, fiquei a ver um filme e a recuperar o meu corpo para uma semana que se prevê difícil e cansativa.

Um dia de sono completo. Domingo apareceu solarengo. Pelo menos ao meio-dia, hora do meu despertar. Com um Barcelona vitorioso e um Real Madrid de volta às boas exibições tomei o meu pequeno-almoço reforçado. Ao fim de ver as estrelas espalharem a sua magia pelo relvado, hora de trabalhar umas horas extra. Infelizmente hoje não deu para ir à praia. Fica para um próxima… Acabado o trabalho, esticar as pernas era o próximo passo. Destino, Larcomar. Objectivo, informações turísticas sobre o norte do Peru. Na tenda de turismo, para minha surpresa tinham informação em português. Nada de mais óbvio, uma vez que este país faz fronteira a Este com a maior nação da América do Sul, Brasiu, país irrmãou!
No regresso, uma passagem pelo parque Kenedy hoje decorado com corredores de poemas e cartas de amor, ao estilo do Central Park de Nova Iorque com a sua decoração dos artistas plásticos bulgaro Christo e Jean Claude, francês. Nas mãos da maioria das pessoas, um ramo especial era acessório quase obrigatório. Hoje, dia 20, é Domingo de Ramos, e como hábito num país fortemente católico, a tradição da bênção dos ramos ainda é mantida e muito respeitada. Mesmo numa cidade, “cosmopolita” como Lima, e no seu centro mais cultural como é Miraflores.
No regresso a casa, um jantar de Tagllari Verde, para dar força ao SCP para segunda-feira, e uma espreitadela na Internet. Tiago Monteiro em 12º na F1 e a Briosa ganhou! Estamos no bom caminho, mas ainda não conseguimos a manutenção. Após uma ausência de uma semana, regressei ao café Zeta e qual o meu espanto quando vejo que mudaram de empregados… Todos se foram, não ficou nenhum! Será que houve “limpeza de balneário”? Ou entraram todos de férias? Não sei! O que sei é que à nova empregada que me atendeu, também com um lindo sorriso, diga-se de passagem, já não podia pedir “o mesmo”… Lá tive que lhe explicar como queria o capuccino. O que fez com enorme competência dada a qualidade do café. Aí terminei o livro de contos de Carrapito, aldeia em Aguiar da Beira, escrito por To-Zé e Carlos Paixão. “Dias de Fazer”, um livro para quem quer saber como era a vida nas antigas aldeias beirãs do interior norte de Portugal. Quem como eu, cresceu rodeado pela natureza e num ambiente rural, é um livro que traz nostalgia e recordações do tempo de menino. Muito bom, altamente recomendado!

Monday, March 14, 2005

Semana 8 -Um fim-de-semana diferente

Quarta-feira, veio rápida, com um sol tímido a aparecer de vez em quando por detrás de uma neblina fina e de umas nuvens passageiras. O trajecto para o trabalho torna-se rotineiro, assistindo ao frenesim diário dos paradeiros de Lima. As mesmas caras de vendedores, engraxadores e pedintes, o mesmo relógio marcando o ritmo do coração financeiro de Lima, o mesmo sinaleiro que todos os dias tenta por alguma ordem, num transito já por si e na mentalidade dos condutores, desordenado. A mesma senhora septuagenária (atiro eu), com o rosto queimado pelo sol e sujo pela imensa poluição, estendia a mão a todos os que não a quisessem ou pudessem evitar. Naquele patamar das escadas de acesso da Via Expressa à ponte de Carnival y Morera, passara já mais horas do que os demais olhares dos que sobem e descem diariamente aquelas escadas metálicas, gastas pelos milhares de sapatos, masculinos ou femininos, modernos ou desactualizados, novos ou já a pedirem um rápida e retardada substituição.
Dia de rescaldo do polémico Chelsea-Barcelona, em que o arrogante Mourinho, adjectivo colocado por vários jornalistas inclusive peruanos, levou a melhor sobre uns “anjinhos” da Catalunha! Há alturas em que se deve estar calado. Eto’o e Ronaldinho demonstraram que têm mais jeito para o futebol que para opinarem… Dia triste também para o Real Madrid que acabou sucumbido frente a uma “Vecchia Signora” que mostrou estar muito jovem. Ronaldo, embora tenha efectuado os seus piques mortíferos, não esteve com a pontaria afinada, assim como Figo e restante galáxia desactivada…
Tomado o café no Zeta, iniciei mais uma leitura. Desta vez um livro de contos de dois professores da zona de Sátão e Aguiar da Beira. Já tinha lido outros deles e encanta-me as histórias das aldeias no “tempo dos afonsinhos”. O modo de vida, as tradições, as brincadeiras, o autêntico, o singular e o castiço da terra e das gentes é transportado para o livro como se de uma viagem no tempo se tratasse. Aqui, mesmo longe, sinto-me perto, pois os meus pensamentos vagueiam por aí, inspirados pela descrição destes cenários e histórias que, por vezes, retratam um pouco a minha meninice e a meninice dos meus pais.

Um dia solarengo, com muito calor e humidade. Os primeiros sinais da chegada do Outono estavam à vista. As primeiras gotas de suor e uma sensação de pele pegajosa estenderam-se pelo corpo. O dia foi passando e com ele tudo se tinha ido, inclusive o sol, lá para as 7h... Com serenidade, a humidade conforme veio, conforme foi. Resultado ainda da chuva de domingo, que embora escassa e célere que foi, ainda deixa marcas por muito tempo. O final do dia culminou com a grande vitória do Sporting, que não fossem aquelas desconcentrações de meninos mimados, quase ensinavam como se faz um jogo perfeito em terras de Sua Majestade e pátria do desporto rei. Ainda vamos à Final!
Pela tarde ficou combinada uma saída, para desanuviar um pouco a cabeça, e nem mais nem menos que uma visita à uma espécie de república cá do sítio. Mas, só para estrangeiros. As recordações dos que tinham passado por lá eram a decoração da casa. Desde uma simples bandeira, até um boomerang, uma nau, ou uma prancha de surf Hawaiana. Pessoas dos 5 cantos do mundo repartiam um espaço sempre em festa. Os festejos na APU (nome da “república”) são quase diários e muito apreciados. Há sempre muita cerveja, mulheres bonitas e uma dose de loucura bem acima da média! No meio disto tudo, um americano a falar português. Melhor, a tentar falar português. O rapaz até se esforçava, mas o raio do brasileiro dá cabo na nossa língua. Acho que vou dar em professor de português, tantos são os pedidos.
A noite acabou num bar sem antes ir atestar numa casa particular em que mais uma vez, tive de explicar um pouco de português, defender a nossa selecção e beber uns canecos, até o pai da anfitriã quase nos “expulsar” carinhosamente de casa. “P’ra noite! Parecem reumáticos…”

Comparando o dia anterior, este dia que começou com mais um pequeno sismo, foi calmo e tranquilo. Entre trabalho, a despedida dos pais do chefe de regresso à Áustria, que nos ofereceram um ovo de chocolate, e mais uma ida ao teatro, ainda houve tempo de ir tomar uns piscos soures marados, com várias misturas, mas muito bons. Tão bons, tão bons, que quase não se sentiam, tirando o momento para nos levantarmos. Até já se cantava com o grupo que actuava no bar! Mas o mais interessante do dia foi, sem dúvida, a peça “La Metamorfosis”, baseada no conto com o mesmo título, Metamorfose de Franz Kafka. Embora nunca o tendo lido, uma vez que não está dentro das minhas preferências, a obra teatral sempre me inspirou muita curiosidade, visto a complexidade e o surrealismo da obra literária. Uma mistura de dança contemporânea com mímica, fizeram com que todos os que leram o livro e esperavam diálogos se espantassem com o desenrolar dos acontecimentos e com a performance do único actor em palco. Na minha opinião e na dos demais foi uma boa interpretação da obra em que o coreografo consegui expor nos movimentos o conteúdo da metamorfose. Mas com sinceridade, 30 minutos de contorções e gemidos não vale os 20 soles pagos. Por mais moderno e contemporâneo que seja. Mais uma experiência enriquecedora, não só culturalmente mas também de novas amizades.

Sábado mal dormido, com visita ao perigoso bairro de Callao. Esta ponta de terra que se expande mar dentro, é um porto natural de águas frias e calma. Habitat de pelicanos de voo rasante e de gaivotas famintas, é o actual porto de comércio, da marinha e lazer de Lima. Zona de muitos restaurantes, das melhores cebicherias e casas aristocráticas do início do século, foi-se degradando lentamente com a diminuição da classe média peruana, até chegar ao mau ambiente dos nossos dias. Salva-se a parte da Punta, onde por questões turísticas e governamentais, há uma forte segurança. Desta ultima avistam-se a duas ilhas de tamanho diferente. A menor, a ilha Fronton, é um rochedo para onde eram levados os presos políticos, os terroristas e os prisioneiros mais perigosos até há bem poucos anos. A maior, a ilha de San Lorenzo, é uma base naval e porto de abrigo a uma colónia de lobos-marinhos. Ficou desde já combinado com as minhas bonitas guias, uma ida à ilha, onde se pode visitar e até nadar com a colónia de tão afáveis animais. Após um cebiche delicioso, hora de conhecer o antigo Callao. Cenário de algumas batalhas navais, porto de abrigo para espanhóis e zona de assalto para os muitos corsários e piratas dos séculos passados que atacavam em busca do ouro Inca, sempre lhe foi dada muita importância dada a sua situação geográfica. Daqui se fazia e se continua a fazer a vigilância das águas de Lima. Nenhuma embarcação escapa à vista do óculo e dos radares dos controladores.
Um velho submarino (tipo o barracuda), que agora serve de museu, fazia as delícias de miúdos e graúdos. Com os seus apertados orifícios e compartimentos dava asas à imaginação e a comentários de pura fantasia dos 8 aos 80. Embora tivesse subido para o casco, não pude entrar, pois as minhas companheiras não tinham grande vontade. Fiquei triste, mas para a próxima abro a escotilha, salto lá para dentro e de periscópio em punho lanço um torpedo daqueles que infestam todos os compartimentos. Nem o sistema de ar os safa… :)
A proteger imponentemente toda esta zona, com uma idade respeitável e o orgulho de nunca ser tomado por completo, surge uma fortaleza peculiar. O seu raro forte, “Real Felipe”, em forma de pentágono, como o nosso em Almeida. Todas as histórias contadas pelo guia foram sem sombra de dúvida, bebidas por todos com enorme sedução. As lutas, os prisioneiros, a vida quotidiana dos militares e habitantes do pentágono foram relatadas como se fora a primeira vez que o contassem. Com as histórias deste forte como base de inspiração, surgiu a primeira película animada totalmente feita por peruanos. Piratas del Callao, foi um forte impulso para a grande quantidade de visitantes e inspirava os comentários dos mais pequenos, tão fantásticos e cómicos, até onde a sua imaginação e recordação do filme os levava.
Após um breve banho, hora de saída e nada melhor que o puro pop/rock. Mais uma trainee que veio, desta vez da Alemanha, mais uma pessoa a conhecer o Sargento Pimenta. Não esteve muito cheio, mas as mulheres bonitas, a boa musica e a muita cerveja, nunca faltaram.

Para não variar muito esta semana, mais uma noite mal dormida. Domingo acordou com um sol que prometia muito. As tão famosas praias do sul iam ser descobertas por mim. Pulpos(polvos) era o meu destino e dos restantes colegas. O mar estava bravo e desregulado, ora ondas para a direita, ora para a esquerda. Ondas enormes a rebentarem a cerca de 50 metros da praia faziam com que a água, como uma maré, subisse e descesse com enorme facilidade. A areia fervia sob um sol abrasador, não mais que 1 segundo com o pé assente no solo era permitido. A figura do pimpão aos saltos pela areia, parecendo uma bailarina em bicos de pés, era do que mais se via. Dava a impressão que se estava a assistir a um episódio de Baywatch ao vivo e a cores, sem as torres, as bóias e a Pamela, pois está claro! Por estas bandas as meninas vão todas ao fundo, a arte de boiar não nasce com elas. Os Mitch Bacanos, esses estavam por toda a parte. Ora levando tampa de uma, ora levando tampa de duas…
A água estava maravilhosa. Ao dizer dos nativos, a temperatura estava normal. Para mim, e para a alemã que estava connosco, estava quentíssima, quase como a do Algarve. Ora aqui temos um benefício que uma Figueira da Foz ou uma Vagueira pode trazer para as nossas vidas. Estes gajos daqui, só com os salpicos gelados das ondas nas praias do norte da Lusitânia, vestiam logo o fato de neve… Não fora a força do mar e ficava por lá um bom par de horas. No final, mais uma queimadura, pois o sol não estava de acordo com o mar revolto e tratou de despejar os seus raios até ao máximo que podia. Corpos suados, cabelos molhados e muita água terminaram com um cebiche, não tão bom como o do dia anterior, e como mandam as regras, umas cheilas heladas… Como sabe bem uma cerveja no final de um tórrido dia de praia. De regresso a casa ainda deu para tomar um Cremolada, uma espécie de gelado feito de gelo picado e sumo natural de frutas peruanas. Uma delícia!
A noite não chegou, sem antes passar, no caminho de regresso a casa, pelo parque Kennedy, onde mais uma vez actuava um grupo de capoeira. Os cânticos vindos de uma igreja local levaram-me a entrar e a ficar um pouco. A paz e tranquilidade naquele lugar de culto eram imensos, dando as músicas um embalamento que nos levavam ao mais profundo espaço do nosso interior. Um leve jantar e um capuccino no café Zeta, e a leitura de mais uns contos de Carrapito, acabaram com um dia muito diferente e proveito. Talvez o melhor fim-de-semana alguma vez passado por terras das tribos do Sol.

Thursday, March 10, 2005

Terça, 8 de Março - Especia Dia Internacional da Mulher

Martes, 8 de Março, dia internacional da mulher um pouco por todo o mundo, e em especial no Reino Unido onde, no domingo anterior, foi festejado o dia da Mãe. Infelizmente, há países e zonas, como os territórios muçulmanos mais radicais onde ainda se pratica a Sharia, que ainda não põe em prática o direito à igualdade prevista na Declaração Universal dos Direitos Humanos. (depois ainda dizem que e sou machista…)
Um dia como tantos outros, cinzento e quente, mas onde se sentia um certo orgulho e perfume feminino a pairar pelo ar. Por cada mulher que passava, notava-se uma áurea mais aberta e cintilante que os costume. Todas mais arranjadas e bem dispostas, com um sorriso rasgado e um caminhar leve e descontraído, como se caminhassem nas nuvens e com a delicadeza que lhes é habitual, evitassem destruir ou deformar qualquer naco de algodão espalhado neste céu descido à terra. Os passeios transformados em passerelle, os homens em meros peões e as rosa como acessório obrigatório na mão de qualquer uma das senhoras. Um dia diferente, sem dúvida.
No escritório, o qual esteve quase todo o dia sem Internet, esta efeméride foi também festejada com um almoço num restaurante pago pelos homens… neste caso, pelo Homem, o chefe! Um almoço agradável, num restaurante ariquipenho, onde se comem os melhores Rocoto Relleno, segundo os especialistas. Ao som de um piano e de uma precursão, o almoço desenrolou-se em amena cavaqueira, com uma atenção redobrada as senhoras da “casa”. Uma histórias da alucinantes da Nigéria pelo boss, penderam também a atenção e foi motivo de chacota geral, pois atitudes daquelas eram impensáveis, há uma semana atrás, na longínqua Abudja, onde a maioria da população nigeriana ainda vive sob as rígidas e desumanas (digo eu) leis da Sharia!
A noite estava quente, convidando as fêmeas a usarem trajes mais leves do que o habitual. Os bares e restaurantes repletos de pessoas do sexo feminino, as discotecas anunciavam festas para elas e muitas ofertas. Num dos letreiros anunciava-se entrada exclusiva a mulheres até à meia-noite. Eram quase onze e meia e na fila, os homens esperavam e desesperavam ao verem passar magotes de mulheres bonitas, joviais e pelos olhares lançados, muito apetecíveis! Afinal hoje é o dia delas, os homens ainda vão ter de esperar…

Segunda feira equatorial

Segunda-feira, primeiro dia de uma semana que se prevê interminável. Não pelo tempo de espera pelo próximo fim-de-semana, mas por uma carga de trabalho e pelo tédio de já não ter mais leitura disponível na nossa bem amada língua de Camões. Depois da tempestade vem a bonança. Assim se deu vida a este provérbio. Um céu azul tão celeste, em que quase não se notava a divisória linha do horizonte com o demais descampado de nuvens, ostentava um sol resplandecente em todo o seu poderio. Depois da chuva miudinha, uma brisa leve e limpa corria pelas artérias da cidade, como a trazer sangue novo a um corpo despertado há já algumas horas. Notava-se um ar mais leve nas ruas e na cara das pessoas, talvez pela expectativa do branqueamento de todo um ambiente pesado de poluição e desconfiança no futuro, que uma qualquer descarga de água vinda de algum Olimpo conseguisse lavar.
No emprego também um ar de limpeza andava no ar. Um estranho cheiro a flores entranhava-se no nariz e o cheiro da relva molhada subia até ao meu escritório. Um bom começo para um dia caloroso e desgastante. A jornada passou-se com custo, lendo, vendo e ouvindo o que se passava nesse ocidental e pequeno rectângulo europeu, trabalhando e resolvendo a custo alguns imprevistos. Pelo meio uma surpresa que me deixou mais descansado, a chegada do meu cartão Multibanco, que tanto jeito me vai voltar a dar. Obrigado paizinho por não se esquecer do pobre filho, desterrado num pequeno paraíso aos olhos dos mais cegos, mas de um purgatório aos olhos dos mais cépticos. Pelo meio os arsenalistas da cidade dos arcebispos venceram uns sadinos sem fôlego para repetir a façanha de quarta-feira passada, deportando desta forma o Sporting para o quarto lugar da Super Liga Galp (sem)Energia.
A noite chegou e com ela um desgosto momentâneo. O final de Equador estava próximo e como sempre uma pequena curiosidade na leitura de um facto histórico no epílogo deitou tudo a perder, desvendando o desfecho da personagem principal. Soube o desenlace, mas não o porquê! Confortado com um cappucino e o sorriso de marfim de uma cada vez mais simpática empregada, li o que restava do capítulo com a promessa de no dia seguinte terminar o livro no Café Zeta. Chegado a casa, dei conta de quão fraca é a carne contra o poder da mente, e na impossibilidade de cumprir o compromisso anterior, tal a ânsia que se apoderava de mim. Um desejo e uma vontade enorme em terminar um capítulo que parecia interminável em tamanho e em novidades desceram e prenderam-me na regalada e apreciável leitura. No final, o desfecho que já esperava, uma morte de amor, em grande parte por uma mulher mas também por uma nobre causa, uma honra e a uma ilha que sem misericórdia, não deixa ninguém partir sem mágoa e vontade de lá voltar. Uma morte, na minha opinião, cobarde, uma fuga em frente para todos os problemas. Estava desfeito mais um mito do Homem perfeito, um modelo a seguir por todos nós, simples descendentes da Adão ;). Como o compreendo, as felinas, sensuais e insaciáveis Vénus deste mundo, conseguem enlouquecer mesmo até o mais astuto e cauteloso predador…

“… agora, perto do fim, ele compreendia pela primeira vez o que sempre lhe parecera incompreensível: o apego de tantos homens brancos a Africa, aquela ligação desesperada e quase doentia que prendera tantos para sempre àquelas ilhas, de que só pensavam partir, mas que verdadeiramente não conseguiam desprender-se.”, in Equador, Miguel de Sousa Tavares

Quantos não temos, não uma ilha, mas um arquipélago de pequenas ilhas no nosso interior das quais nos custa desprender, seja por falta de vontade, desleixo, impotência ou simples comodidade…

Monday, March 07, 2005

Semana 7 - Uma aventura sismica (5,7 escala de Richter)


Lunes, 28 de Fevereiro, último dia (quando não é bissexto) de Carnavales, como se intitula por estas bandas do equador o mês mais pequeno do ano. Aqui no Peru o Carnaval é festejado durante todo o segundo mês do ano. Mais com as travessuras que com a festa e as cores típicas desta festividade, embora se encontrem alguns resistentes nas ruas e calorosas noites limenhas. Uma tradição um pouco estranha para um povo tão católico, dado o sentido de Carnaval, pois, segundo o calendário Gregoriano sempre se realiza 40 dias antes da Páscoa.
Pois bem, este dia correu normalmente como qualquer outro. Agradado, mas não surpreso com o empate entre Porto e Benfica e a goleada, ainda que imerecida, de um Sporting justamente vencedor. Os Leões estão de volta ao trono, com Liedson a bisar, Rocka e Nicolae a facturar. Uma predador inigualável, já com 50 ataques mortíferos às balizas da vasta Super Liga! Um dia de trabalho cansativo mas que no final se revelou bastante agradável. Vamos lá ver se é desta que o Leão mostra a sua raça e se mantém na liderança classificativa.
A mais estranha tradição de Carnaval, e uma das mais temidas, tem a ver com o facto de ser permitido atirar com água, em qualquer recipiente ou invólucro destrutível no acto do embate, aos pobres desprotegidos e desprevenidos transeuntes. Por vezes, em zonas ”menos civilizadas” como eles dizem por aqui, também se atira com ovos e farinha ou até água suja com líquidos e óleos… Como que atirar somente com água a um pobre caminhante seja um acto civilizado. Diferentes culturas, diferentes interpretações da palavra. Mas pronto, voltando às saudosas brincadeiras do Secundário em vésperas da terça-feira de Carnaval. No escritório, como já me tinham advertido e eu resignadamente consentido, tive um pequeno baptismo a estas estranhas tradições. Nada de muito grave, apenas umas gotas de água enviadas por uma menina mais atrevidita. O pior foi na rua, quando fazia o meu trajecto para casa. Á minha frente caminhava um rapariga descontraída e vestida de branco da cabeça aos pés. Pobre alma, do primeiro balão, o que acidentalmente (ou não) me atingiu, ainda se consegui desviar, mas do segundo já não teve hipótese. Agora, o cenário final podem vocês imaginar. Sinceramente, não foi bonito de ver. Não só pelas desproporções corporais da rapariga mas pelo acto e embaraço da moça. O que era branco passou a ser quase transparente… Um misto de raiva e de sorriso estendeu-se na minha cara. Afinal, “em Roma sê romano”. Ainda esbocei uma reacção aos “civilizados” ocupantes do carro que bombardeava a rua com balões de água, mas foi de imediato contida, ficando-se somente por um sonoro “Fucking bastards”. Ao deambular pela rua, os sinais de que não fora o único infeliz daquela barbárie eram mais que evidentes. Poças de água ou raparigas molhadas eram sinónimos da passagem daquele tanque incomodamente refrescante. Dei comigo a pensar no que afinal é uma adaptação completa, e a concluir que a adaptação é um processo interminável.


O dia, como sempre e de forma repetitiva e teimosa, nasceu com uma neblina que ofuscava o topo dos prédios mais altos de uma cidade prateada pela mistura dos cinzentos e a luminosidade dos primeiros raios de sol. Os espelhos e vidros que servem de vestimenta a estes gigantes da capital tornam-se distribuidores de uma riqueza que não pertence a ninguém e ao mesmo tempo só aos mais afortunados. Durante a manhã cobre a cidade com tons de prata e no final do dia, em tons de ouro, como a autêntica e legendária El Dorado. Nem todos, num país como este, têm o privilégio de desfrutar de um clima tão generoso. Preocupações sociais, que desconhecíamos e que só nos apercebemos quando já nos sentimos impotentes e revoltados com a falta de solidariedade que se nota nos demais “notáveis” peruanos. Senhores sem qualidade e capacidade, que ganham, sentados num parlamento, cerca de 10 mil dollars por mês, fora as luvas, (mais que o Presidente da República, ou qualquer outro politico nacional) asfixiam as populações, desfalcam o estado e a democracia, demonstrando à comunidade internacional, sem remorsos, o porquê da instabilidade politica vivida neste continente amarico-dependente. Enfim…

Consolado pelo cappucino da noite anterior e pelo sorriso da empregada, o despertar de Terça foi mais calmo e descansado. A ira e o sentimento de incompreensão pela molha da noite anterior tinham passado como um breve pensamento. A dar as boas vindas ao primeiro de Março, um sol radioso deixava que os seus raios fossem transportados pela suave brisa matinal que se fazia sentir. O dia ocupou-se com a leitura dos desportivos e comentários sobre o desfecho da jornada e um quebra-cabeças no trabalho que no final acabou por ser solucionado. O dia ainda não tinha terminado, e a minha primeira vez estava para chegar.
Às 7 em ponto, como agendado com uma nova e boa amiga, encontrámo-nos no Centro Comercial LarcoMar. Olhei duas vezes para ela a ver se não me enganava, depois de uma pequena e disfarçada volta, para me certificar, lá fui ter com ela. Um pouco embaraçado e com falta de à vontade que me é característica, lá fomos para a sessão. Prometia muito, duas horas de acção e comédia, uma das mais recomendadas do Peru. Teatro La Plaza, no mesmo centro comercial, cheio de gente. Jovens, menos jovens, e umas tias que acabaram por sair a meio do espectáculo, preparavam-se para uma noite bem porreira. Assim foi, uma obra entre o Stand Up Comedy e o teatro de comédia normal. El Peru Já Já, (o Peru ah ah, de gargalhada) é uma peça que nos fala da história deste país desde as primeiras civilizações, passando pelos Incas, o colonialismo espanhol, a ditadura de Fujimori e Montesinos, terminando na situação actual com Toledo. Um enredo fantástico e cheio de gargalhadas. Soubesse eu mais sobre a história deste país, os mexericos de cá e as gírias e de certeza que me partia todo a rir. Se assim ainda me vieram as lágrimas aos olhos, imaginem se compreendesse tudo. Tive uma excelente interprete, que me prendeu a atenção durante e depois do espectáculo. Um sorriso ainda melhor que da empregada! Ai ai ai… Dada a última volta pelo centro comercial, com uma breve passagem pela varanda da baia de Lima, hora do regresso a casa ainda com o som do rebentamento das ondas a deambular pela cabeça.
Espanto! Um indiano, amigo da família, está lá em casa por 2 ou 3 dias. Eu até ando a ler um livro que fala sobre esse país de sons, cheiros e cores magníficas! Uma conversa de uma hora foi o suficiente para saber como param as modas por aquelas bandas e convencer-me que estava à frente de um tipo porreiro, conhecedor e respeitador, embora liberal, das mais variadas culturas do seu país e do mundo.
Acabei a noite a ver futebol espanhol, com um empate no derby da Catalunha…

Um pequeno abanão. Quem será? Outro e mais outro. Oh raio! Continua tudo a tremer ninguém me está a abanar. Um despertar sísmico e revolucionário. Gostei da experiência, mas prefiro que as placas tectónicas dancem outra música mais suave ou quando eu não estiver por aqui… Os sismógrafos marcaram 5,7 na escala de Richter. Assim estivesse o Dollar por estas bandas, aí, até eu dançava, pulava, fazia o pino e dava piruetas! As janelas abanaram com mais intensidade, mas ao contrário da última vez, hoje deu para sentir o abanão durante cerca de 15 segundos. Parecia uma centrifugadora de roupa tal era a vibração.
Levado pelo agitado embalamento deixei-me dormir mais tempo que o habitual, o que me obrigou a uma mini correria para o emprego, onde, cheio de fome, almocei um Pollo a Manhattan. Vejam lá bem! Já parece alta cozinha francesa à americana! Mais trabalho e problemas durante o dia e uma digestão lenta e penosa, atormentaram-me o resto do dia. Ainda por cima não fiquei nada contente com o corte de raciocínio a que me obrigaram no final do dia. Hoje tiveram de me tirar do escritório. Ainda dizem por aí que eu não sou trabalhador e que venho para aqui coçar qualquer coisa… É só más línguas!;) Para desanuviar, nada melhor que uma leitura ao som de jazz e blues com o sabor do cremoso capuccino do Café Zeta a invadir-me o paladar. Aquela inglesa do "Equador" é mesmo doida. Ah leoa!!! Gostava de saber onde é que o Miguel de Sousa Tavares se foi inspirar para esta personagem, não tem essa informação na bibliografia final…

Agastado por mais uma noite de futebol, desta vez o Real Madrid jogava com o Bétis de Sevilha, acordei cansado e mal disposto. Resolvi ficar mais 5 minutos na cama. Os habituais 5 minutos que de repente se transformaram em meia hora. Mais uma corrida contra o tempo para chegar ao emprego antes das 10… Não fui bem sucedido, mas o importante é que cheguei são e salvo.
Já é quinta-feira. Como o tempo passa depressa. O dia correu de feição em questões de trabalho, e por incrível que pareça recusei uma saída nocturna, que até prometia muito. Não sei o que se passa comigo. Estou estranho. Acho que estou a ficar viciado no trabalho. Mas como os vícios não são nada bons, tenho de ir até Coimbra em Maio para tratar deste mau hábito que estou a adquirir. Nada melhor que uma terapia de choque! ;) A saída da chamba (trabalho) deu-se quase às nove e meia da noite, com uma vontade enorme de devorar um boi ou comer um vaca…
O dia terminou com a inevitável ida ao Café Zeta, onde mais uma vez o sorriso da empregada me acolheu de braços abertos e me fez sentir em casa. Desta vez tomei um Moka, estava bom mas o primeiro que tomei estava bem melhor…

Fim-de-semana. Dois dias de descanso no aconchego do lar, com a família, os amigos, dar banho ao cão ou ir até à praia com a trouxa às costas e montar um banquete sobre o areal… ou noite, copos, mulheres bonitas e bronzeadas, dormir, futebol e um pouco de praia. É óbvio que como não tenho família, opto pela segunda! Mas antes disso ainda há que passar todo este calvário que é a sexta-feira.
O almoço foi diferente. Devido à desinfestação que vão fazer, fomos ao restaurante comer, e diga-se de passagem que a partir de agora vou lá sempre. Pago o mesmo e ainda vejo umas caras bonitas… Trabalho e mais trabalho, chego à conclusão que vou ter de levar cenas para casa. Isto não cheira nada bem, mas quando se tem de fazer não há remédio. Conversa aqui e ali, com a malta de Portugal e resto do mundo, para se por as novidades em dia e termina-se tudo por volta das 5. Agora é hora dos “bugsbusters” entrem em acção. Dêem cabo deles, não deixem nenhum!
A noite, infelizmente, foi demasiado calma e pachorrenta. Resolvi, com o resto de energia que me restava, continuar o trabalho que trouxe do escritório e ver um filme que há muito queria observar. A vontade era tanta de sair, que hoje nem houve Café Zeta

Sábado foi um despertar lento e calmo, como se cada parte do corpo fosse acordando conforme desejasse. Sem pressas, nem o abrupto acordar com um banho de água gelada. Afinal é Sábado, não há horas marcadas nem urgência em cumprir horários, o tempo passa mais devagar e o meu pobre corpo livra-se de um gélido e molhado massacre… É dia de Liga Espanhola, uma escapadela à praia ou a uma qualquer galeria ou exposição ou centro de artes e espectáculos, acabando por uma saída nocturna até para lá do sol nascer. Uma rotina que hoje quebrei, começando a assistir à final de um campeonato de escalada, num dos Hotéis da bela e depravada Paris Hilton. Ela não estava lá, oh que pena, e eu que fui lá só para a ver… L O dia continua com mais um pouco de trabalho de casa e um grande golo de Ronaldo, que partiu os defesas do Valência. Mais um empata a travar a recuperação do Real, e ainda por cima o Barcelona ganhou… Mérito para os Blaugrana pela temporada que estão a fazer, mas vão para em Stanford Bridge onde o Mourinho e a sua armada os vão deter. Chelsea!!!
A noite veio de rompante. Era mais uma festa de recepção, desta vez a uma rapariga da Hungria, que vem por um ano. Pobre alma, ainda por cima não fala nada de espanhol, nem spanenglish nem hungranhol… Há-de aprender, em um ano tem muito tempo!
Aquilo foi mais uma grande buba, mais uma vez por 25 lucas bebes o que queres. Foi mais uma de caixão à cova, ainda por cima as chicas do bar eram bem boas! Não saí do balcão… Como costumam dizer, há sempre uma cruz que temos de carregar. Pois bem, a minha é ter de falar português com o pessoal de cá. Querem aprender! Vá-se lá saber porquê?! Há uma rapariga que fala bem, pois viveu no Brasil durante algum tempo, mas é um bocado cola! Infelizmente, as meninas do bar não estavam lá muito interessadas em aprender português. E eu que tinha tanto gosto em ensinar-lhes…

O dia Santo de Guarda estava encoberto, pelo menos às 15:30 da tarde, hora do meu despertar. Dormi tudo o que tinha para dormir e mais alguma coisa para a semana que se aproxima. Quando saí da cama, uma hora depois de acordar, uma breve tontura deixou-me de novo estendido na cama. Será que estou grávido? Não, era apenas uma breve quebra de tensão provocada por uma noite mais puxada que o habitual.
Um pequeno-almoço reforçado com manga, papaia e um sumo de maracujá deu-me energia suficiente para enfrentar o que restava deste dia cinzento. Já a tarde ia no seu fim quando, na volta habitual pelo Parque Kennedy, uma musiquinha de capoeira me entrou no ouvido. Mais uma vez, a escola dos brasucas estava a demonstrar e a projectar um espectáculo que terá lugar no próximo sábado. Em seguida, no pequeno coliseu de 4 anéis, embutido no solo, actuou um grupo de boleros. Qual Julio Iglesias qual que, aquilo sim, ver todos aqueles casais de gente menos jovem a dançar com uma energia inesgotável, deu-me ainda mais vontade de viver. Lindo e muito romântico também. A ternura estava presente em todos os gestos que, mais ou menos expressivos, interpretavam com toda a sua alma. Um espectáculo digno de ver, com os dançarinos a esforçarem-se ao máximo para no final lograrem apenas uma salva de palmas ou em alguns casos uma enorme ovação. Deixado para trás aquela festa e depois de uma passagem pela Igreja, deu-se o reencontro com o grupo de capoeira. Desta vez estavam a fazer uma demonstração séria e feroz do que é esta arte marcial. Gestos rápidos e violentos, acrobacias espectaculares e alguns golpes certeiros involuntários no corpo do adversário, acompanhados de um som seco e estaladiço, faziam com que a roda fosse várias vezes violada e corrompida. As pessoas que assistiam, tal como eu, estavam fascinadas com o que viam. Coreografias sincronizadas, com pinos, pontes, voltas completas, moinhos, e até alguns saltos mortais levavam a assistência ao rubro. Um pouco mais de tempo e até eu ia para lá aos saltos. Ficou pelo menos a água na boca…
Por falar em água, a chuva chegou a Lima passava algum tempo das 8 da noite. Quando saí da sala de Internet, onde me inteirei dos resultados negativos dos meus amores portugueses, estava uma chuva miudinha que ameaçava fortalecer-se em pouco tempo. A derrota do Sporting e o empate da Académica acompanhadas pelas vitórias de Porto e Benfica, deixaram-me em baixo. O distinto objectivo pelo qual lutam tornara-se momentaneamente mais distante. Não é suficiente dizer-se que se pratica o melhor futebol da Primeira Liga, é preciso pô-lo em prática e ganhar. "De boas intenções está o inferno cheio". Safou-se o Chelsea com a vitória e um golo do Ricardo Carvalho, o Deco com um passe de mágico para o Eto’o marcar e o bom desempenho do Tiago Monteiro, esse cavaleiro luso na sua primeira prestação ao serviço de Sua Majestade, Formula1, a rainha do automobilismo.
A chuva que caiu deixou no ar um cheiro a terra e a limpeza como já não sentia desde as primeiras chuvas em Portugal. Veio-me à memória uma recordação de Portugal. Nessas quentes tardes de Verão em que por vezes chove e troveja, há sempre o cheiro que fica no ar, um misto de rosas e outras flores com o da terra acabada de fresar e há pouco abandonada pelas searas de trigo ou centeio, que a mim tanto me agrada…Um pequena camada de água encobriu-me os olhos, como que uma lágrima de saudade a querer sair, mas ficou por aí. Nada melhor que um suspiro e a certeza de um breve regresso para voltar ao normal. O café Zeta ficara para trás, assim como um dos últimos capítulos de Equador.
Agora sentado num banco de plástico branco, escrevendo esta cónica numa escrivaninha onde cabe o computador e pouco mais, vou olhando pela janela, vendo os vultos passarem, escutando os sons da rua e sentindo uma pequena e húmida brisa a entrar pela janela. Esta invisível invasora traz com ela um odor que, ao olhar para a bandeira, a camisola da selecção das quinas ou um pequeno cartaz da latada, me faz recordar os cheiros das molhadas manhãs primaveris de Maio em Coimbra, por altura da Queima das Fitas…

Monday, February 28, 2005

Semana 6 - Rotineira com dia preocupante

A descida à rua fez-se depois de um acordar típico de segunda-feira. Bastante demorado e muito contrariado. A semana começou cinzentona, sempre com os ares de Lima muito carregados de humidade e de nuvens dissipadas pelos raios de sol que deixam a nu toda a beleza de um perfeito azul celeste. Cá fora, uns quantos homens do batalhão de polícia de intervenção, munidos de todo o seu equipamento, encostavam-se às paredes dos edifícios, esperando o momento da chegada da sua presa para se reagruparem e levarem a sua missão a bom porto. No início até me assustei, mas quero dizer que até agora ainda não percebi o que estavam para ali a fazer. Com a carga policial do pólo 2, agora penso sempre duas vezes antes de passar no meio dos bichos…
Dia tranquilo, sem tirar a vitória suada do Benfica e os demais pesamos por uma derrota eleitoral que não é minha, mas dadas as convicções e o partido que para o bem e para o mal defendo, tive que aceitar. Discussão aqui e ali. Ver, ouvir e ler notícias frescas e mais antigas, tudo foi feito com calma, analisando e comparando resultados e reacções. Final de dia pouco produtivo profissionalmente. Havia motivo, afinal era Portugal e o nosso futuro que estava em causa.
Jantar porreiro, ida ate ao café zeta onde hoje tomei um capuccino de graça (o 10º pagam eles) e regresso a casa com mais uns capítulos do primeiro romance de Miguel de Sousa Tavares lidos.

Uma semana muito tranquila, de terça a quinta tudo na mesma. O nascer do dia com a neblina que esconde um sol que não gosta de se expor muito a esta quantidade de poluição que se abate sobe a atmosfera de Lima. Uma semana de alegrias e tristezas com casos caricatos que mais uma vez comprovam que estamos sempre a aprender e a enfrentar novas situações. A alegria pelo apuramento do Sporting para os oitavos de final da taça UEFA contrasta com o pesar pelo afastamento do rival Benfica e o empate do FC Porto que compromete seriamente a continuação na Champions do campeão europeu. A apatia pela vitória de José Sócrates, que afinal agora vamos saber quem realmente é, contrastava com a apreensão do futuro do maior partido político nacional. Santana sai, quem vem, quem fica e para que? Mas é claro que estas situações se passam muitas e variadas vezes, não havendo por isso, nesta altura de maturidade, muito a aprender.

A semana europeia foi vista de fugida em bares, restaurantes e RTP multimédia, mas escutada com a atenção e qualidade que a TSF online permitia. Pelo menos consegui ouvir o relato do Porto, Sporting e Benfica. Findado o dia com o FCP-Inter, uma escapada até ao larcoMar na quarta-feira e mais uma saída até a um bar, onde assisti a mais futebol, desta vez copa dos libertadores, permitiu desanuviar um pouco de um dia extremamente cansativo. Chegado à porta e casa, sons de salsa e merengue invadiram-me os tímpanos. Tinha-me esquecido que era o dia de anos da senhora da casa. Ai ai ai, entrei de mansinho, com um melão a caminhar para melancia, e lá tive de cumprimentar mais uma vez todos os primos, tios, netos, sobrinhos irmãos e amigos da senhora. Bem, parecia uma recepção oficial. “-Oh, Portugal, muito bom! Figo! Deco! Eusébio! Porto!” Este último não sabia se eles falavam da equipa ou da bebida, fica ao vosso critério. A parte dos amigos foi a melhor. Uma suiça, muito bonita de tenra idade e conhecedora do nosso país foi apresentada como inquilina da casa. Antiga inquilina, amiga da família, só ficou por dois dias… Infelizmente, acho que nos íamos dar muito bem. :) Não estive muito tempo, afinal a melancia pesa e eu não estava com disposição para festas. A correria no corredor era tremenda, os gritos dos miúdos pareciam trovões na minha cabeça e a musica na “pista” estava sempre a subir. Á porta tinha uma sentinela que fazia o favor de me manter acordado, servia-se dela para, levado pelos sons latinos, tocar um pouco de precursões. Não sei com que cara apareci à porta, mas o puto saiu de lá a correr e não mais regressou! Tomado um comprimido e ao som do Karaoke da sala, adormeci. Não sei se anestesiado com o comprimido ou com as prestações dos cantores embriagados.

A quinta-feira foi mais calma e alegre, o SCP tinha passado com mérito e o trabalho correu melhor. A janta foi num restaurante árabe e os copos num típico bar inglês no meio de discotecas latinas. Aí pude assistir a um resumo dos leões a banharem-se confortavelmente numa banheira gigantesca, mas sem água para afogarem o futebol lusitano. No final, mais uns bares, estes de jazz e blues que me darão algum jeito, mas isso logo se vê. Regressado a casa e depois de uma interessante conversa com a bela inclina que ficava pela ultima noite, nada melhor que uma breve leitura para completar um dia calmo e sem muitas emoções.

Mais uma sexta-feira, mais um dia com vontade de aprender mais. Uma aula de surf desmarcada o início da tarde, trocou-me as voltas e o humor. Nada melhor que um convite de una chica para restabelecer os níveis de disposição e confiança. A noite foi numa discoteca chamada “Produto Peruano”, onde se paga 25 soles (6€) e se bebe tudo o que quiser. Bem foi uma coisa descomunal… A musica era muito variada, desde house, techno, rock, pop, latinas, samba e até um grupo de salsa e merengue ao vivo. Mas os problemas estavam para vir. Saídos do bar, tentei fazer um pagamento com o Visa, mas ele não existia. Tinha-o perdido, sem saber onde. Tinha feito um levantamento, possuia o dinheiro e o talão, mas o cartão nada. Preocupações a quintuplicar levaram com que regressasse do meu estado de embriaguez ao estado mais sóbrio que alguma vez tive, num tempo record. Percorridas as ruas, falado com as pessoas dos sítios onde estive, nada encontrei. Telefonema feito para cancelar o cartão e para casa a avisar da desventura, estava na hora de ir ao banco. (Aqui estão abertos aos sábados até às 5 e durante a semana até às 8) Final feliz! Tinha-me esquecido dele na máquina e por lá ficou, engolido e destruído sem nenhuma compaixão. Aqui saca-se o dinheiro, depois o talão e só no final o cartão. Como ainda tenho os hábitos de Portugal saquei o dinheiro e o talão e levado por um qualquer estado de ansiedade, pensei já ter guardado o cartão e esqueci-me de o retirar. Esta brincadeira custou-me um dos momentos mais preocupantes de toda a minha vida. Quando cheguei a casa eram já 11 da manhã e à minha espera uma cama para 4 horas.

Acordado de um sono muito leve por a boa nova do pagamento do salário, o meu primeiro salário, comecei um sábado terrivelmente longo. O meu corpo pagava a factura do stress e cansaço da noite anterior. Não havia futebol e vontade para sair. Tomei um banho e resolvi dar uma volta pelas ruas onde me rebentei ainda mais. A noite convidava a sair, mas o peso das pálpebras era insuportável e a cama foi o meu destino.

Domingo solarengo, com um despertar mais calmo e longo. O dia começou a assistir à derrota do Real Madrid ante um Deportivo La Coruña que realizou a sua melhor exibição da época. Pode ser que seja o início de uma recuperação à muito esperada. Tomado um banho após mais uma sessão de filmes, hora de dar uma volta pela rua antes de retornara a casa para ver os Óscares 2005. Aqui pelo menos dão a horas decentes.:) Com Million Dollar Baby e com Clint Eastwood, mais uma vez, justamente consagrados, chegou a hora de descanso. Aviador também mereceu um destaque mas ainda não foi desta que Martin Scorsese teve o tão desejado e merecido Oscar para melhor realizador, que deveria ter ganho, em 2003, com Gangs of New York. Sem tirar mérito a Chicago, que trouxe os musicais de volta à alta roda cinematográfica, ou a Roman Polanski e ao seu The Pianist. Sem tirar a sua importância histórica e todo o horror que nunca é de mais lembrar, sempre que se toca em judeus e holocausto é sinónimo de êxito garantido. Dá que pensar... Por este andar o Scorsese só vai ganhar o Oscar de carreira. Pobre homem, para alguém que revolucionou, à sua maneira, o cinema moderno, nunca ter ganho em 5 tentativas é deveras frustrante!!! Lembra-me um antigo spot de um concurso da rádio “Não ganhou. Fica p’ra próóxiimaaa!”